quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Sobre o cuidado com ruas movimentadas


Sabe quando você está andando em uma rua bem movimentada? Gente, informação, barulho. Tem alguém na sua frente. Mas a curta distância, apenas para manter um mínimo de espaço. Você está bem atrás. Vocês andam no mesmo ritmo, com passadas iguais.
Mas aí, acontece alguma coisa e a pessoa para de uma vez, sem te avisar, sem que você esteja esperando. Ela não dá nenhum sinal de que está cansada ou com algum problema no sapato que dificulte o caminhar. Ela para sem planejar, sem informar, sem aviso prévio.
Você, que continuava avançado, se assusta. É necessário frear de uma vez. Uma parada brusca que interrompe seu trajeto minimamente organizado, bem traçado.  E mais: você precisa fazer um esforço tremendo para não cair, não se machucar e nem ferir os que, por alguma razão, estão em torno de vocês e podem sofrer por consequência.
Você para. Esse tempo parado é incalculável porque depende de muitas variáveis. Depende de quanto tempo essa pessoa permanecerá estagnada na sua frente, se ela voltará a andar, se voltará a andar com você ou escolherá outros caminhos. Depende também do incentivo de quem precisa, de alguma forma, que você volte a se movimentar.
Você volta. Sempre volta. Talvez o começo seja difícil, porque reiniciamos em um ritmo lento. Demora um pouco para voltarmos a velocidade máxima.  Algumas vezes é necessário um impulso a mais para contornar essa pessoa que continua parada. Você precisa seguir, tomar um novo fôlego, reconquistar o ânimo perdido, traçar novas metas, recalcular rotas.
É uma retomada complicada.
Com forças renovadas, vem uma nova fase. Simplesmente não existe ninguém na sua frente. Você pode fazer qualquer trajeto, andar mais para a direita ou mais para a esquerda, alternar o ritmo. Você escolhe.
Essa liberdade não tem tempo definido. É impossível saber quanto vai durar. Tudo vai depender de quando uma nova pessoa vai virar a esquina e, sem você perceber ou permitir, vai entrar no seu caminho e fazer tudo recomeçar.

Caminhadas, trombos, recomeços. Talvez isso seja sobre os cuidados com ruas movimentadas. Talvez seja sobre a vida.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Para todos aqueles que pensaram que era fácil

São Paulo. Liberdade. Bar de karaokê. Quarta-feira.
Nosso dia preferido de karaokê. O bar mais vazio nos permite cantar mais e mais à vontade.
Estávamos em sete pessoas, dos quais seis residem atualmente em São Paulo. Cinco rondonienses e duas acreanas.
Quando chegamos, apenas mais uma mesa ocupada no local. Nela, um rapaz que logo resolveu que, por sermos poucos, deveríamos interagir.
Sendo assim, cada vez que ele subia no palco para cantar, começava com um discurso oferecendo a música aos presentes.

-Eu queria oferecer essa música para as meninas aqui da minha mesa, para o pessoal da outra mesa ali e para todos aqueles que pensaram que era fácil.

Mais uma rodada e ele novamente no palco. Nesse momento, já tinha descoberto nossas origens e o discurso começou a tomar forma.

-Eu queria oferecer essa música para as meninas da minha mesa, para o pessoal de Rondônia, do Acre e para todos aqueles que pensaram que era fácil.

Alguns minutos depois, chega mais um grupo. Logo são inseridos na brincadeira.

-Eu queria oferecer essa música para as meninas da minha mesa, para o pessoal de Rondônia, do Acre, para o pessoal gente fina que chegou agora e para todos aqueles que pensaram que era fácil.

Nossa referência nos levou a descobrir que, na mesa dos novatos, tinha uma pessoa de Boa Vista. Na nossa, estava a Carol, que canta "de verdade" e deu um show no amadorismo (que a gente ama) do karaokê. O moço que controlava a fila da cantoria nos chamava pelo nome que anotávamos no papel juntamente com o número da música, o que proporcionou uma apresentação informal. Tudo isso ajudou para que o discurso do rapaz começasse a ocupar um espaço maior.

-Eu queria oferecer essa música para as meninas da minha mesa, para o pessoal de Rondônia, especialmente para a Carol, do Acre, Roraima, para o pessoal gente fina daquela mesa ali, para a Fátima, para o Celso e para todos aqueles que pensaram que era fácil.

Mais alguns minutos e mais gente adentra o recinto. Dessa vez, um grupo que misturava brasileiros e norte-americanos. Pareciam estar vindo de um evento mais formal. As roupas entregavam esse detalhe. No início, tímidos, mas foram incentivados a se juntar a nós.

-Eu queria oferecer essa música para as meninas da minha mesa, para o pessoal de Rondônia, especialmente para a Carol, do Acre, Roraima, para o pessoal gente fina daquela mesa ali, para a Fátima, para o Celso, para o pessoal que chegou agora - não fiquem tímidos, se juntem a nós -, e para todos aqueles que pensaram que era fácil.

O grupo entendeu o recado. Em minutos se colocaram de pé, dançando e cantando. A rodada dessa vez demorou um pouco. Quando nosso amigo voltou ao palco...

-Eu queria oferecer essa música para as meninas da minha mesa, para o pessoal de Rondônia, especialmente para a Carol, do Acre, Roraima, para o pessoal gente fina daquela mesa ali, para a Fátima, para o Celso, para o pessoal que chegou agora, que já está aqui dançando, e para todos aqueles que pensaram que era fácil.

Uma pausa. O ambiente escuro, com luzes azuis, dava o tom. E, finalmente, ele concluiu:

-O amor... o amor não é fácil!

<3